Na semana passada, a chegada ao porto de Sendai, no norte do Japão, da viagem inaugural do novo navio Kangei Maru foi saudada com festa – porque ele chegou trazendo 15 baleias mortas.

O motivo da comemoração foi o “sucesso” da primeira expedição do mais novo navio caça-baleias do Japão, construído pela empresa baleeira Kyodo Senpaku, lançado recentemente.

Convocados, funcionários da empresa ficaram perfilados junto ao porto, agitando bandeiras, enquanto o navio desembarcava sua infame carga: contêineres inteiros com pacotes já embalados de carne do que, dias antes, foram 15 baleias da espécie Bryde, capturadas no mar territorial do Japão – um dos três únicos países do mundo que ainda caça baleias, juntamente com a Islândia e a Noruega, que, por também não serem signatários da convenção que proibiu a captura destes animais, em 1986, continuam fazendo isso livremente em suas águas.

“Felizes em capturar baleias”

Quinze dias antes, o Kangei Maru – orgulhosamente construído pela Kyodo Senpaku para ser o maior navio do gênero no Japão – havia zarpado do porto de Tóquio para sua primeira expedição de caça, cercado de expectativas.

Ao retornar, com uma dezena e meia de vítimas (média de uma baleia morta por dia), confirmou o seu extraordinário poder de trucidar cardumes de grandes baleias, já que sua captura ultrapassou as 250 toneladas de carne em uma viagem que era apenas experimental. Quatro dias depois, partiu de novo, para mais uma expedição de caça no mar japonês.

“Estamos felizes em capturar baleias, e muito orgulhosos deste navio”, disse aos jornalistas, na véspera da partida, o presidente da Kyodo Senpaku, Hideki Tokoro, vestindo um ridículo chapéu em forma de baleia, em tom de quase deboche.

Festival de asneiras

“As baleias estão no topo da cadeia alimentar dos mares. Elas se alimentam de criaturas que impedem que os peixes cresçam, a fim de alimentar os homens. Precisamos matar baleias para manter o equilíbrio do ecossistema”, disse Tokoro na ocasião, à rede BBC, entre outras asneiras – como a de que a carne de baleia pode impedir a queda de cabelo e até curar alguns tipos de câncer.

“Capturar baleias faz parte da cultura japonesa, e sua carne dá segurança alimentar aos japoneses”, acrescentou Tokoro, cuja empresa vem tentando reverter a diminuição no consumo de carne de baleia pelos japoneses com agressivas campanhas de marketing, que incluem pagar para influenciadores digitais divulgar o alimento, e instalar máquinas de venda automática de sashimis e filets de baleia em pontos movimentados de Tóquio.

Felizmente, não tem dado certo, e o consumo só vem diminuindo. Especialmente entre os mais jovens – mesmo caso da Islândia, que já cogita parar de caçar baleias, por ser uma atividade hoje economicamente pouco rentável. Mas a suspeita é que a Noruega continue capturando mais baleias do que o Japão e a Islândia juntos.

O Kangei Maru, novo navio japonês exterminador de cetáceos, é um prodígio da indústria naval japonesa quando se trata de capturar, descarnar, triturar e processar carne de baleias – que já saem do navio embaladas e congeladas, pronta para serem consumidas.

Tem 113 metros de comprimento por 21 de largura, uma área interna de corte do tamanho de duas quadras de basquete, onde baleias são picotadas até só restarem seus ossos, e uma “revolucionária” – de acordo com a empresa dona do navio – rampa de embarque, na parte de trás do casco, capaz de puxar do mar animais de até 70 toneladas – bem mais do que nos demais navios do gênero, nos quais a inclinação das rampas limitava o tamanho das capturas.

A caça é feita com canhões de arpões explosivos de alta precisão (quando eles não conseguem dar cabo do animal, disparos com rifles entram em ação), embora, dada suas gigantescas dimensões, a vocação natural do Kangei Maru seja a de receber e processar baleias que são capturadas por outros barcos menores, para que eles sigam caçando no mar por mais tempo.

É um navio-mãe – embora sua função seja para tirar vidas e não gerá-las. Uma autêntica indústria flutuante de processamento de carne de baleia. Ou um “matadouro”, na versão dos ambientalistas.

Terá drones para acahar as baleias

Em breve, o Kangei Maru também será equipado com drones de última geração, capazes de detectar, do alto, cetáceos que estejam a mais de 100 quilômetros de distância.

Quando eles estrarem em operação, as pobres baleias que nadam em mares japoneses não terão a menor chance.

O objetivo é a Antártica

Além disso, o Kangei Maru tem uma autonomia que lhe permite navegar até o lado oposto do planeta, como o Antártica, maior reduto de baleias do mundo – e onde o seu antecessor, o Nisshin Maru, da mesma empresa, atuou durante anos.

Mas a Kyodo Senpaku garante que o novo navio não irá capturar baleias lá. Pelo menos, por enquanto.

“Só iremos para a Antártica se o governo do Japão assim ordenar, por conta de alguma crise alimentar”, disse o patético presidente da empresa aos jornalistas, durante a inauguração do novo navio, no último mês de março.

“O que eles estão fazendo no mar do Japão é apenas um teste do novo navio”, disse recentemente à rede CNN, o ambientalista canadense Paul Watson, um dos fundadores do Greenpeace e da Sea Shepherd, duas das mais atuantes organizações de defesa das baleias no mundo.

“Mas o objetivo, certamente, é levá-lo para a Antártica”.